“A Lei Rouanet tira recursos que poderiam ir para a saúde e para a educação.”
“A Lei Rouanet é só para grandes artistas e parceiros dos no governo.”
“É fácil desviar recursos e transformar a lei em farra.”
Como outras fake news que ganharam força nos últimos anos sobre a tão famigerada“Lei Rouanet”, afirmações como estas costumam vir acompanhadas de discussões polêmicas, e na maior parte das vezes, de inverdades e desinformação, contribuindo para que muita gente acredite que apenas projetos grandes ou famosos recebem ajuda do governo ou que a lei esteja ligada ao mau uso do dinheiro público.
Isso tudo, é claro, gera burburinhos e grandes problemas: além de “sujar” o nome da Lei Rouanet , fazem com que as empresas e os profissionais independentes da área, que poderiam recorrer a ela, tenham dúvida sobre sua idoneidade.
Apesar de toda a exposição negativa e ataques ideológicos sofridos, em especial nos últimos quatros anos de governo, o mecanismo contribuiu com cerca de 50.000 projetos culturais no país, produzindo um impacto econômico de 49,7 bilhões de reais, em mais de 30 anos de existência.
Para ajudar a esclarecer os principais mitos envolvendo a lei e entender o que realmente é ou não verdade, preparamos este artigo com informações validadas e seguras para mostrar a sua importância.
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A Lei de Incentivo à Cultura no Brasil em comparação aos mecanismos de fomento de outros países
A Lei
Criada em 1991 no governo de Fernando Collor, pelo então secretário nacional de Cultura, o diplomata Sérgio Paulo Rouanet, a Lei nº 8.313 instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) , com o objetivo de ampliar o acesso à cultura em todas as regiões brasileiras e estimular a produção cultural como geradora de renda, emprego e desenvolvimento para o país.
Três mecanismos fazem parte do Programa: o Fundo Nacional de Cultura (FNC), os Fundos de Investimento Cultural e Artístico (Ficarts) e o Incentivo à Cultura — também chamado de mecenato — hoje, conhecido como Lei Rouanet .
A lei permite que qualquer cidadão que realize a declaração de imposto de renda ou qualquer empresa tributada com base no lucro real possa apoiar projetos culturais utilizando o mecanismo de incentivo fiscal. Pessoas físicas terão desconto de até 6% do imposto devido e pessoas jurídicas, de até 4%.
É FATO OU FAKE?
“A Lei Rouanet é só para grandes artistas e parceiros do governo”
Fake – Qualquer pessoa física ou pessoa jurídica, envolvida em atividades de natureza cultural, pode inscrever seu projeto na Lei Rouanet pelo site do SALIC – Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura , até 30 de novembro, para análise da Secretaria Especial da Cultura.
A aprovação passa por cinco etapas . Em nenhuma delas existe um julgamento quanto ao mérito do projeto ou do proponente, isto é, se quem submeteu a ideia é um artista ou produtor famoso. Portanto, a decisão sobre onde e para quem os recursos serão destinados não está nas mãos do governo ou do presidente, mas sim das empresas patrocinadoras , que têm liberdade para direcionar parte de seus impostos em benefício do desenvolvimento social.
“A Lei Rouanet é um instrumento liberal de gestão cultural. Ela dá autonomia aos agentes de mercado para a destinação de recursos, com mínima interferência do Estado” — Carlos Cavalcanti, CEO do Atelier de Cultura em entrevista à Veja.
O governo apenas cuida do parecer técnico do projeto, ou seja, faz a verificação da documentação, do cumprimento das regras, enquadramento de objetivos e orçamento, e depois o encaminha para a análise final pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (Cnic) .
Aprovada a proposta, que passa a ter status de projeto, é dada a autorização para captação de recursos . É válido dizer que mesmo com o sinal verde, o projeto pode não ter sucesso em captar todo o dinheiro dentro do prazo estipulado — dos 60.699 projetos aprovados entre 2009 e 2018, apenas 32.705 (pouco mais do que a metade) conseguiram viabilizar recursos.
fonte: https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/wp-content/uploads/2021/01/Maiores-projetos-captados-Rouanet.png
Os dados sobre proponentes e projetos são acessíveis para consulta pública na internet pelo Portal de Visualização do Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura – VERSALIC . Como mostra a figura, entre os 10 maiores captadores de recursos de 2020, encontram-se instituições culturais como o MASP, o Instituto Cultural Inhotim e outros, que promovem editais ligados à ocupação de pequenos artistas até exposições de nomes artísticos com prestígio nacional, provando que além de transparente, a Lei Rouanet é para todos.
“A Lei Rouanet tira recursos que poderiam ir para a saúde e para a educação”
Fake – Segundo apurado pelo jornalismo da Lupa, agência de notícias especializada em checagem e combate à desinformação, que integra a International Fact-Checking Network (IFCN) , não é verdade que o dinheiro captado por artistas via Lei Rouanet seja desviado ou retirado de escolas e hospitais .
Como dito anteriormente, a Lei Rouanet faz parte dos mecanismos federais de incentivo fiscal do governo, que permitem às empresas e pessoas físicas destinar, em forma de doação ou patrocínio , parte de seu imposto de renda às propostas culturais aprovadas pelo programa. No entanto, o repasse da verba deve obedecer às novas regras de teto e prazo estipulados pela Instrução Normativa Secult/MTur nº 02/2022 , publicada em 7 de junho de 2022.
O valor máximo de captação, que era de R$60 milhões, foi para 1 milhão em 2019. Com a nova publicação, este valor foi novamente reduzido em 50% de seu total, ficando em R$500.000,00, devendo considerar também o tipo de atividade cultural:
R$ 500 mil: tipicidade normal;
R$ 4 milhões: tipicidade singular – desfiles festivos, eventos literários, exposições de arte e festivais;
R$ 6 milhões: tipicidade específica – concertos sinfônicos, museus e memória, óperas, bienais, teatro musical, datas comemorativas (Carnaval, Páscoa, Festas Juninas, Natal e Ano-Novo), inclusão de pessoa com deficiência, projetos educativos e de internacionalização da cultura brasileira.
“Ah, mas é dinheiro público!” — Sim, é verdade! Entretanto, o valor do repasse de verbas públicas à cultura deve estar previamente garantido no orçamento do governo no ano anterior , ou seja, é um dinheiro fixo com destino certo. Se não fosse para a cultura, não seria necessariamente alocado em outro setor, visto que cada área tem orçamentos próprios e pré definidos.
Embora menos conhecidos que a Lei Rouanet, existem outros mecanismos federais de incentivo fiscal, como a Lei de Incentivo ao Esporte, o Fundo Especial para a Infância e Adolescência e o Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (Pronon).
“É bom lembrar que a cultura é um direito constitucional, assim como o direito à educação. A indústria automobilística e outros setores da economia também recebem incentivos fiscais. E isso é comum. Vale também ressaltar que a cultura é uma indústria limpa e que movimenta a economia, assim como outras indústrias.” — Mariana Kadletz, advogada que atua há 12 anos com leis de incentivo, consultada pela agência Lupa.
“É fácil desviar recursos e transformar a lei em farra.”
Fake – O principal escândalo envolvendo a lei teve grande repercussão em 2016, com a deflagração da “Operação Boca Livre”, que investigou o desvio de 180 milhões de reais em verbas federais de projetos aprovados pela Lei Rouanet e que tinha como alvo da investigação, feita pela Polícia Federal, o Grupo Bellini Cultural.
O caso motivou a instauração de uma CPI para investigar irregularidades na concessão de benefícios fiscais previstos na lei. Diante das falhas descobertas, o relatório final da CPI recomendou que fossem criados melhores mecanismos de controle e transparência do uso do dinheiro público , com uma distribuição menos centralizada dos recursos; no entanto, o relatório registrou o consenso em torno de sua preservação.
“É correto afirmar que a lei deve ser aprimorada e atualizada, mas a sua extinção seria dramática, levando o mundo da cultura a uma grande crise.”
— Eduardo Saron, diretor do Instituto Itaú Cultural
Polêmicas em torno de nomes famosos, como Claudia Leitte, Maria Bethânia, Cirque du Soleil, Rock in Rio , e o mais recente deles envolvendo o sertanejo Zé Neto, são exemplos que contribuíram para a construção de um imaginário de desvirtuamento, de que a lei existiria para que artistas pudessem “mamar nas tetas do governo”, e de que seria fácil burlar o mecanismo.
Mas é necessário explicitar que tais operações só foram possíveis graças às novas regras de transparência e ao rígido controle durante a prestação de contas , fase em que havendo o acusamento de incompatibilidades orçamentárias fiscais e tributárias, a secretaria pode vir a solicitar explicações detalhadas e documentos extras ao proponente.
“A Lei estabelece obrigações extremamente rigorosas para o produtor cultural; a utilização dos recursos exige um sério padrão de gestão contábil e financeira.” — Carlos Cavalcanti, CEO do Atelier de Cultura em entrevista à Veja}
“Cantores famosos torram milhões com a Lei Rouanet”
Fake – Ao contrário do que fazem acreditar as fake news espalhadas nas mídias sociais, nem milhões podem ser torrados, nem o dinheiro captado pela lei vai parar totalmente no bolso dos famosos. Em 2014, o cantor Luan Santana foi alvo de polêmica ao ter o projeto de uma turnê aprovado para receber incentivos da Lei Rouanet no valor de R$ 4,1 milhões. O projeto que tinha como proponente a LS Music Produções Artísticas Ltda, empresa que agencia a carreira musical do artista, não teve captação de recursos e foi arquivado .
Outro nome famoso alvo de polêmicas, é o de Daniela Mercury. Segundo consta na base de dados da Versalic, em 2015, a cantora propôs um projeto de música para a cidade de Salvador no valor de R$ 300 mil e captou R$ 270 mil . Em 2018, ela chegou a propor outros projetos, mas ao contrário do que apontava uma mensagem falsa nas redes, o valor captado não foi de R$ 13,9 milhões, e sim de aproximadamente R$ 3,6 milhões.
Ambos os casos são exemplos que ajudam a entender as regras de enquadramento dos artigos 18 e 26 da lei, que estipulam a forma e os percentuais de dedução sobre o Imposto de Renda :
Por via de regra, estes projetos de música popular são aprovados pelo art. 26, com a dedução restrita a apenas 30% do valor , no caso de patrocínio. Ou seja, semelhante aos episódios envolvendo Luan Santana e Daniela Mercury, ainda que o projeto aprovado seja, por exemplo, de R$ 1 milhão, a empresa só poderá patrocinar 300 mil reais a título de incentivo fiscal pela Lei Rouanet, ficando os outros 700 mil reais sem possibilidade de redução no IR, o que diminui as chances de captação.
Conclusão
Tão mentirosas quanto tendenciosas, as fakes news sobre o assunto ofuscam o verdadeiro valor que tem a Lei Rouanet, que há mais de três décadas promove o incentivo à cultura no país e tornou-se fundamental para sociedade, mercado e iniciativa privada. É por isso que manter público o acesso a dados e números da Rouanet são importantes faróis que ajudam a colocar luz sobre o mecanismo e rebatem muitas das críticas que a lei sofre.
Inscrições de projetos vão até 30 de novembro
A NUMEN Produtora é especializada na execução de cada uma das etapas de aprovação de projetos junto aos programas de incentivo à cultura, como Lei Rouanet e ProAC ICMS. Desde 2016, pesquisamos as principais demandas atuais em Responsabilidade Social Corporativa e ESG do mercado para a criação de projetos culturais de impacto.
O prazo para as inscrições na Lei de Incentivo à Cultura, ainda este ano, acontece até 30 de novembro, no portal online do Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura – Salic .
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